segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

"Martina"

Uma das vantagens da falta de aulas é a possibilidade de escolher meus horários de trabalho. É o privilégio que me é reservado, nesses três meses, de escolher a que horas quero ir dormir e acordar. Vejam, não raras vezes durmo às quatro da manhã, e acordo ao meio-dia, pra almoçar.
Eu trabalho numa geladeira. Uma sala de uns doze computadores mantida a 18 graus celsius o dia inteiro, e isso pra quem não sabe, me faz usar pelo menos uma camisa de manga, muito embora a temperatura do mundo exterior esteja beirando o inferno, como nesses meses de verão. Mas, voltando ao assunto, eu geralmente volto desse lugar muito tarde da noite, e durmo em casa depois de uns minutos, usando os seriados do sbt ou o corujão pra dormir tranquilamente, manhã afora. Eu volto tarde da noite, lá pelas três da manhã, e geralmente fito os prédios do caminho, vendo quais luzes solitárias estão ainda acesas, compartilhando comigo a lucidez na madrugada.
É nessas horas que a minha cidade é minha, e meu exílio de tantos anos torna-se quase a minha casa, e eu me vejo, mais de uma vez, compartilhando a reta da UFV com ninguém além das capivaras. Uma delas, inclusive, parece até já me reconhecer; é uma das grandes, e sempre que eu passo por ela (se nenhum guardinha da vigilância estiver por perto), digo um "você era um filhote quando eu entrei aqui, hein?", e termino de descer meu caminho, pela noite de uma reta sem ninguém, entre a manada de capivaras - minhas fiéis companheiras pela noite. Eu posso enganar a mim mesmo às vezes, mas acho que nunca vou enganar aqueles olhares desconfiados que elas têm, e elas parecem saber, às vezes, as coisas que eu estou deixando pra trás: estou deixando pra trás uma das minhas melhores amigas, só pelo inferno que isso é, só pelo bem que isso vai fazer a nós dois. É isso no que dá ser tão diferente de todo mundo.
E as capivaras nunca vão me dizer o que eu deveria ter feito, se me disserem eu volto a dormir à noite.

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