sábado, 2 de fevereiro de 2013

Ausência II

Tem chovido, e chovido muito.
Fiquei em Belo Horizonte quase uma semana, depois fui até Rio Pomba ver meu pai. Menos de vinte quatro horas depois, cá estava eu de volta à Vice City, de volta ao meu exílio. No meu retorno, acabei descobrindo que a mãe da minha vizinha tem Alzheimer, e agora ela está morando na casa ao lado. A velhinha fica  horas sentada na varanda, e possui a inocente combinação entre uma doença que lhe tira a memória e a curiosidade. Já troquei uma ou duas palavras com ela, e já falei meu nome umas cinco vezes.
Mas a conversa interessante mesmo foi com a minha vizinha. Ela insistia em me dizer que a vida que a mãe dela tinha, quando as duas se conheciam, não existe mais. O que aquela doença a havia ensinado era que viver o presente é tudo o que mãe e filha tinham, naquele momento. Ela não poderia jamais permitir que a doença afetasse as duas, e ela jamais poderia agir como se as lembranças que faziam parte dela também fizessem parte de sua mãe.
E, como tudo, eu tracei um longo paralelo comigo mesmo. Eu não vou estar no pensamento das pessoas o tempo todo, e jamais devo agir como se estivesse. E ninguém vai se lembrar que você existe até que você, de fato, exista. A memória das pessoas, com Alzheimer ou não, é muito curta, e as presenças são infinitamente mais sentidas do que as ausências. Eu parei de cobrar, de repente, que as pessoas se lembrassem do que tivemos no passado. Meu presente é um lugar melhor.
Da última vez, saindo de casa, eu ouvi da varanda ao lado: "Oi, menino. Você esqueceu o guarda-chuva."
Eu fui buscar o guarda-chuva.

2 comentários:

Aline Fernandes disse...

Já te falei que sempre leio seu blog?
me identifico mto e em especial esse texto me fez pensar ainda mais no modo como ando vivendo...

Unknown disse...

Seja sempre bem-vinda, Aline!
Essa velhinha tem feito meus dias, e eu acho importante não deixar a oportunidade de aprender passar, mesmo com quem acha que não tem nada pra ensinar.
:)